sábado, 9 de junho de 2018

Acesso aos Aeroportos: Por que é tão complicado?

Trem da série 9500 da CPTM estacionado em Aeroporto - Guarulhos.
Foto: Gustavo Bonfate.
Com a recente inauguração da tão aguardada linha 13 Jade da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos, a CPTM, muito se discutiu sobre a nova linha da companhia que estava em obras há pelo menos quatro anos. A linha Jade liga o município de Guarulhos, região metropolitana de São Paulo, até a estação de Engenheiro Goulart, zona leste de São Paulo onde há acesso gratuito a linha 12 Safira, Brás à Calmon Viana. A questão que foi muito discutida entre especialistas, entusiastas e passageiros sobre a nova linha é: Por que foi tão difícil fazer uma ligação entre a capital paulista e o seu principal aeroporto internacional? É o que vamos entender nesse artigo.
Desde a grande revolução que aconteceu no setor aéreo após a chegada das companhias aéreas de baixo custo (Low Cost, em inglês), voar passou a ser algo mais comum para a maioria da população de diversos lugares como nas Américas, Europa e Ásia. O conceito de baixo custo surgiu em meados dos anos 1970 e 1980 nos EUA, mas somente nos anos 2000 é que surgiu a primeira companhia aérea seguindo esse conceito no Brasil. 
AirTrain JFK (Nova York): sistema inaugurado em 2003 para interligar a estação de metrô
Jamaica até os terminais do maior aeroporto de Nova York.
Foto: retirado da internet, créditos aos autores. 
Com isso, muitos brasileiros puderam ter acesso ao transporte aéreo, que sempre foi desde os seus primórdios algo acessível apenas para uma parcela da população, normalmente pessoas com um poder aquisitivo maior. Com passagens aéreas mais baratas e a concorrência no setor aéreo aumentando, a demanda por vôos comerciais aumentou em um número muito alto, e fez com que a infraestrutura aeroportuária precisasse de ampliações. Em países como China, Estados Unidos e Inglaterra, se investiu muito, não somente em terminais de passageiros ou ampliação da capacidade, mas no transporte até eles. Os maiores investimentos nos transportes para os aeroportos veio através de ferrovias ou sistemas de trens leves interligando sistemas de metrô até os terminais aeroportuários.
Novo terminal aeroportuário de Goiânia.
Foi inaugurado em 2016 e até os dias atuais não há um sistema eficiente de transporte.
Foto: retirado da internet, créditos aos autores.
O Brasil, mesmo com o tráfego aéreo aumentando, sempre foi um país rodoviarista e por isso os grandes aeroportos como Guarulhos, Galeão, Brasilia e Confins nunca receberam um transporte mais rápido, eficiente ou mesmo de melhor garantia de conforto. O resultado é o que vemos hoje: congestionamentos quilométricos nos acessos aos terminais, percursos cansativos dos centros urbanos até os aeroportos, passageiros perdendo vôos por conta do tempo gasto no percurso e problemas ocasionados pelos trânsitos. 
Quando o Brasil foi anunciado como país sede da Copa Fifa de 2014, muita expectativa foi gerada para saber como o governo iria resolver a questão dos deslocamentos entre os aeroportos e os estádios e cidades. Quatro anos se passaram desde o fim dos jogos e o que aconteceu foi vergonhoso com obras que foram diversas vezes paralisadas, abandono de muitos projetos, bilhões desperdiçados e a mobilidade urbana ainda complicada. Mais vergonhoso talvez que a derrota do "7 à 1" perdido contra a Alemanha.
VLT de Cuiabá:
Obra prometida para Copa 2014 segue sem operar.
Foto retirada da internet, créditos aos autores.
Fonte: https://diariodotransporte.com.br/2017/06/16/a-novela-da-obra-do-vlt-de-cuiaba/#prettyPhoto
Voltando a São Paulo, com a linha 13 funcionando integralmente desde o dia primeiro de junho, até então a linha estava em operação assistida com horário reduzido, muitas reclamações surgiram. A principal reclamação é que os usuários com destino aos terminais do aeroporto precisam utilizar um ônibus gratuito disponibilizado pela concessionária que administra o aeroporto, a GRU Airport. Mas por que a estação de trem não ficou mais próxima dos terminais?
Simples. Quando projetaram a linha 13 no início dos anos 2000, previa-se duas linhas para atender a cidade de Guarulhos: A linha 13 Jade como um serviço de trens metropolitanos partindo do Brás, e a linha 14 Ônix como um serviço destinado aos passageiros do aeroporto partindo da estação da Luz com trens indo direto para os terminais aeroportuários e um percurso separado das demais linhas. Enquanto a linha Jade ficaria encarregada de atender a cidade de Guarulhos, que desde o final dos anos 1960 não possuía mais ligação férrea com a capital, a linha Ônix seria uma linha destinada aos passageiros que precisavam seguir para o aeroporto com maior agilidade.
Antigo Mapa Metropolitano de São Paulo:
Note a presença das linhas 13 e 14.
Mapa sem data, retirado da internet.
Com o cancelamento da linha 14 Ônix por conta da falta de interesse da iniciativa privada e a concorrência com o TAV (Trem de Alta Velocidade) São Paulo - Rio (que nunca saiu do papel), ficou a cargo da linha 13 atender além da demanda de passageiros da cidade de Guarulhos, também aos passageiros do aeroporto. O problema era que, com a concessão do aeroporto à iniciativa privada em 2012, a nova administradora alegou que o terreno onde a CPTM iria implantar a nova estação seria usado como um centro comercial e com isso inviabilizou a expansão da linha até os demais terminais (2 e 3). A mesma concessionária disse em nota na época que havia um projeto à ser construído por ela mesma chamado de "People Mover", que ficaria encarregado de transportar os passageiros desde a estação de trem até os três terminais do complexo. O projeto seria algo semelhante ao implantado em Nova York, por exemplo, com pequenas composições atendendo os terminais desde a estação de trem.
Percurso do então "People Mover".
Créditos aos autores, retirado da internet.
Fonte: https://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=1631623&page=399
Algum tempo depois, o projeto foi cancelado e a empresa construiu um simples terminal de ônibus anexo a estação da CPTM, e isso acabou gerando descontentamento por parte dos futuros passageiros. Hoje, o trajeto é feito por ônibus e levam entorno de sete minutos até os dois outros terminais, isso quando não há congestionamentos na rodovia Hélio Smitd, algo recorrente. 
Terminal de ônibus anexo a estação Aeroporto:
Percurso por ônibus é a principal reclamação.
Foto: retirado da internet, crédito aos autores.
O mesmo ocorreu em um outro aeroporto que serve a capital paulista, o Aeroporto de Congonhas, onde desde 2012 a linha 17 Ouro do Metrô está em obras. A linha, que será em monotrilho, foi prometida como uma linha para atender a demanda da Copa de 2014 assim como a linha 13 Jade e deveria ser concluída, em sua primeira fase, até 2014. Com diversos atrasos ocorridos nas obras, a linha permanece até os dias atuais em obras e a nova data para a inauguração é em meados de 2019.

Linha 17 Ouro: atendimento parcial.
Foto: Créditos aos autores.
Fonte: http://mobilidadesampa.com.br/2015/02/acompanhamento-de-obras-da-linha-17-ouro-2/
A linha ouro teve diversos empecilhos desde a sua fase de projetos, onde a primeira fase ligaria a atual estação São Judas da linha 1 Azul até o aeroporto, sendo cancelado devido a vários prédios tombados no traçado. No final das contas a linha deverá operar inicialmente entre as estações Morumbi, conectada a linha 9 Esmeralda, até a estação Congonhas, excluindo completamente a demanda oriunda da linha Azul. O único trecho em obras é o entre Morumbi e Congonhas, enquanto que os outros dois trechos, entre Morumbi e São Paulo - Morumbi da linha 4 Amarela e entre Brooklin Paulista e Jabaquara foram engavetados.
A própria linha se contradiz, pois quando decidiram pela tecnologia monotrilho que é mais barata e consome menos tempo de implantação, e olhamos as infinitas obras ao longo da avenida Jornalista Roberto Marinho (antiga Água Espraiada), é preciso lembrar que a falta de planejamento e interesses políticos atrapalham muito o desenvolvimento da mobilidade no Brasil em geral.
Embora esteja localizado em um ponto de grande movimento da cidade, na avenida Washington Luís (corredor Norte - Sul), é de difícil acesso para usuários oriundos do Metrô, sobretudo porque é necessário depender de linhas de ônibus comuns que são constantemente prejudicadas pelo trânsito. 
Obras da futura estação Congonhas da L-17 do Metrô em meados de 2016.
Fonte: http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2016/06/obras-das-estacoes-da-linha-17-ouro-do-monotrilho-sao-retomadas.html
No caso da linha 13, o marketing feito pelo governador nela de que seria uma opção viável até o aeroporto é algo totalmente fora de cogitação quando avaliamos o tempo gasto desde a estação da Luz, centro da capital, até o aeroporto. Considerando as três baldeações que precisaram ser feitas (linha 11 até o Brás, linha 12 até Engenheiro Goulart e linha 13 até o Aeroporto), o tempo de percurso pode variar algo entorno de uma hora, isso não considerando de onde o passageiro vem, por exemplo, da Avenida Paulista ou da região mais ao sul da cidade.
Estação Engenheiro Goulart:
Trens direto devem atrair mais passageiros.
Foto: CPTM Divulgação. 
A CPTM vai oferecer mais dois serviços além do Regular (entre Aeroporto - Guarulhos, Guarulhos - Cecap e Engenheiro Goulart), são eles: o Conect, que deve operar em alguns horários ligando a estação Aeroporto - Guarulhos até a estação Brás com paradas em Guarulhos - Cecap, Engenheiro Goulart e Tatuapé, sem a necessidade de trocar de trem em Engenheiro Goulart. E o Airport-Express, que custará R$ 8,00 e deverá operar com horários específicos e trens partindo diretamente da estação da Luz sem paradas no caminho até o aeroporto. Este último serviço será direcionado especificamente aos passageiros com destino ao aeroporto, enquanto que os outros serviços devem atender a população guarulhense. 
Serviços à serem oferecidos pela CPTM.
Créditos aos autores, fonte: https://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=1631623&page=399
Já há planos de expansão da linha 13 nas duas extremidades para atender de melhor forma os passageiros. A extensão rumo a Bonsucesso deve atender ainda mais passageiros dentro da cidade guarulhense, a mais populosa da Grande São Paulo, e a extensão rumo ao Parque da Mooca onde a linha deverá ter mais integrações à outras linhas, ou Chácara Klabin, região sul de São Paulo.
Futuro traçado da Linha 13 Jade.
Fonte: http://www.aeamesp.org.br/22semana/wp-content/uploads/sites/5/2016/09/P3-Paulo-de-Magalh%C3%A3es.pdf
Antes da inauguração da linha Jade, passageiros que precisavam ir da capital até o Aeroporto de Guarulhos não possuíam muitas opções. Quem precisava de agilidade e não poderia seguir de transporte coletivo, utilizava seu próprio automóvel ou de aplicativos, e mesmo assim ainda corriam riscos com problemas externos, tais como o trânsito caótico de São Paulo, o trânsito imprevisível da Rodovia Presidente Dutra ou da Ayrton Senna. Além disso, o passageiro ainda precisava se preocupar com a Rodovia Hélio Smitd, rodovia que dá acesso ao aeroporto partindo das rodovias Ayrton Senna e Dutra, que constantemente está congestionada. 
Para quem não possui um veículo próprio ou não pode pagar pelo serviço de táxi ou outros, havia duas opções: seguir de um ônibus executivo pagando no valor de R$50,00 ou através da ligação suburbana com tarifa de R$6,15. 
Ônibus da linha 257 TRO no Tatuapé:
Famosa ligação entre o Metrô-SP ao Aeroporto de Guarulhos, serviço suburbano.
Foto: Gustavo Bonfate.
O serviço executivo do Aiport Bus Service parte de pontos de grande interesse de São Paulo como a Praça da República, Avenida Paulista, Aeroporto de Congonhas, e os terminais rodoviários da Barra Funda e Tietê. Embora seja um serviço diferenciado e sem paradas ao longo do percurso, é inacessível para muitos passageiros pelo custo.
O serviço semi-urbano, que custa bem menos, é a linha 257 TRO que parte do Terminal 3 do Aeroporto de Guarulhos, atende os outros dois terminais e segue para o terminal norte da Estação Tatuapé. Ambos os serviços, executivo e suburbano, são controlados pela EMTU-SP (Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos) e operados pela Serveng, empresa contratada pela EMTU. Há outras linhas metropolitanas que atendem o aeroporto como a 800 TRO (Mogi das Cruzes - Estudantes) e custando R$15,95, e a 538 TRO (Arujá - Centro) custando R$5,90.
Serviço executivo para o Aeroporto:
Embora uma ligação direta, é muito caro para alguns passageiros.
Foto: Gustavo Bonfate.
Além disso, ainda há linhas municipais de Guarulhos que atendem o aeroporto, com a linha 488 Circular Aeroporto que parte de um acesso próximo ao Terminal 3 e circula os outros dois terminais. A linha 331, que parte do Terminal Metropolitano do CECAP, atende a rodoviária da cidade e segue para os terminais do aeroporto. Ainda há uma linha seletiva, a S172, que atende pontos de interesse tais como o Internacional Shopping e o centro guarulhense. As duas primeiras linhas custam R$4,70 pagando em dinheiro em espécie e R$4,30 no bilhete único de Guarulhos, e a seletiva R$5,90. 
Trem chegando à estação Aeroporto - Guarulhos:
Trem deverá auxiliar parte da população guarulhense.
Foto: Gustavo Bonfate.

Por fim, podemos ver que ao mesmo tempo em que a mobilidade urbana dentro das grandes cidades brasileiras caminham de forma complicada, o transporte entre as cidades até os seus respectivos aeroportos também sempre foi prejudicada por interesses políticos e econômicos. Assim como São Paulo, que depende cegamente dos transportes sobre rodas para acessar os seus terminais aeroportuários (seja Guarulhos, Congonhas e Viracopos em Campinas), muitas outras capitais ainda não resolveram ou amenizaram essa questão. A medida que o tráfego aéreo aumenta a cada ano, os problemas podem agravar cada vez mais e caberá as esferas públicas tomarem alguma decisão quanto a isso.
Texto: Victor Santos.