segunda-feira, 9 de março de 2020

CPTM e Supervia: uma breve comparação

Logotipo de ambas as empresas.
Fonte: CPTM e SuperVia
Fazer uma análise ou uma crítica a um sistema de transporte sempre pode ser um divisor de águas, afinal de contas para fazer isso é necessário avaliar muitos quesitos que vão além de analisar linhas ou frotas, mas sim dados geográficos e planejamento urbano. Mas acima de tudo, para criticar ou analisar é necessário conhecer de perto cada caso. 
Tendo isso em vista, nós do Metrópole SP visitamos o sistema de transporte do Rio de Janeiro em novembro passado. Vamos fazer uma comparação focada na rede de transportes metropolitanos sobre trilhos, entre a CPTM - Companhia Paulista de Trens Metropolitanos, operadora estatal de São Paulo, e a Supervia, concessionária do sistema de trens urbanos do Rio de Janeiro. 
Essa comparação não tem como objetivo denegrir a imagem de nenhuma das empresas, mas entender como cada uma opera e atende aos seus milhares de passageiros. Além de comparar o único exemplo de concessão do modal ferroviário de transporte metropolitano com a CPTM. 


Estações
Começando por onde todos os passageiros sempre passam, ou deveriam passar, pelas estações. A CPTM, atualmente possui 94 estações no sistema, boa parte construída pela RFFSA/CBTU ou pela Fepasa, nas décadas de 1960, 1970 e 1980. Por conta disso, há muitas estações que não possuem itens de acessibilidade ou mais conforto aos usuários, como é o caso de Aracaré, estação construída pela RFFSA nos anos 1960 para a linha Variante Poá, atual linha 12 Safira. 
Outros casos como as estações das linhas 7 Rubi e 10 Turquesa da companhia, antigas linhas da Rede Ferroviária. São estações sem o mínimo de conforto, acessibilidade ou modernidade. Embora estejam relativamente conservadas, ainda fazem parte do "calcanhar de Aquiles da CPTM", já que ela vêm tentando com os poucos recursos provindos da gestão estatual reformar ou reconstruir as estações mais antigas. 
Contudo, há muitas estações que foram construídas, reconstruídas ou reformadas ao longo dos anos de administração da CPTM.
Estação de Itaquaquecetuba ainda no padrão CBTU.
Foto: Victor Santos (autor).
Embora ainda tenha estações centenárias em operação, há estações modernas em operação como Engenheiro Goulart, reconstruída e entregue em 2017, Aeroporto-Guarulhos e Guarulhos-Cecap, entregues em 2018, e as estações da linha 9 Esmeralda, com exceção das estações construídas pela Fepasa, e que foram construídas pela CPTM. 
Trem série 9500 estacionado na recém reconstruída estação de Engenheiro Goulart. 
Foto: Victor Santos (autor)
Na Supervia, o que vimos foi um processo de modernização de algumas das 102 estações operantes no sistema. Como o Rio de Janeiro foi palco de muitos eventos nos últimos anos, entre eles a Copa FIFA 2014 e as Olimpíadas de 2016, as estações que ficam no caminho para os locais dos eventos receberam uma modernização para atender a demanda com mais conforto. Diga-se de passagem, algumas das estações que foram modernizadas e que visitamos estavam melhores que algumas estações que a CPTM modernizou, como a estação Engenho de Dentro, modernizada duas vezes, uma vez em 2007 para os Jogos Paraolímpicos, e em 2015 para as olimpíadas.
Estação Olímpica de Engenho de Dentro.
Autor: Victor Santos
Mas, como nem tudo são flores, também visitamos estações que fazem Aracaré e Engenheiro Manoel Feio aqui em São Paulo parecerem estações do século XXI. A estação de Santa Cruz, localizada na região Oeste da capital carioca, possui um  acesso que “assusta” por ser escondido entre tantos camelôs, acesso este feito através de uma íngreme escada fixa e sem muita segurança aos passageiros. Para os cadeirantes, o acesso fica parcialmente fechado, sendo aberto somente quando um funcionário é chamado para abrir um portão que dá acesso mais direto a plataforma, mas somente a uma, caso o cadeirante precise ir para outra plataforma, talvez seja um tormento para ele. O mezanino, localizado um nível acima das plataformas, possui a bilheteria e as roletas para o pagamento, mas nenhum funcionário foi visto para orientar os passageiros ou inibir fraudes ao sistema.
Estação de Santa Cruz, ponta do ramal de Santa Cruz.
Autor: Victor Santos
A estação de Campo Grande, outra estação da mesma linha, também deixa qualquer usuário da CPTM abismado com o estado de conservação bem ruim da estação. Elevador? Escada rolante? Rota tátil? Talvez possa parecer coisas simples, mas são esses itens que podem fazer a diferença para muitos usuários, sobretudo para idosos, gestantes ou pessoas com mobilidade reduzida. 
Estação de São Francisco Xavier, note a ausência de cobertura em boa parte da plataforma.
Autor: Gustavo Bonfate.
Outra estação que nos deixou um tanto perplexo, seja pelo tamanho ou pela péssima conservação, é a estação Central do Brasil, a principal e marco zero da empresa. Dela, parte todas as principais linhas e ramais da SuperVia, ou seja, o movimento é intenso como a estação Brás da CPTM. Aliás ambas já foram interligadas pelos trens de longo percurso no passado, pela Estrada de Ferro Central do Brasil no passado. 
A estação Central do Brasil é imensa, duas vezes o tamanho da estação Brás, possui 13 plataformas e uma extensa área antes do embarque, onde esta o saguão da estação que possui quiosques e lojas. 
Embora possua uma imensa importância histórica e atual, as plataformas estão péssimas para uma estação de grande porte e alto movimento. Rachaduras, falta de cobertura na área de embarque, desnível e vão entre o trem e a plataforma que faz qualquer Paulista sentir saudades da estação Brás, reformada no início dos anos 2000, mas mantendo dois prédios originais tombados pelo patrimônio histórico.
Trem série 3000 estacionado na estação Central do Brasil.
Estação não está tão conservada quanto esperávamos.
Autor: Victor Santos.
Fora a questão da limpeza, que no dia da visita, um dia comum, estava muito ruim. Na verdade, de todas as estações visitadas, a maioria possuía problemas de limpeza. 
Na CPTM, embora haja muitos casos de falta de limpeza ou conservação da estação, quase sempre é possível encontrar uma estação limpa, conservada ou assegurada por funcionários, coisa que quase sempre não encontramos nos dias em que utilizamos a Supervia. Quando muito tinha um segurança nas plataformas. 
Outra situação que não encontramos com muita frequência na ferrovia Paulista, mas que existem e infelizmente vem se agravando, é a invasão de pessoas as linhas. Na CPTM existe a invasão de pessoas que não pagam a tarifa e embarcam pulando muros ou catracas. Embora seja uma prática infelizmente comum na CPTM, não chega a ser algo tão assustador quanto os casos que vimos na ferrovia carioca.
Havia estações no Ramal Santa Cruz que simplesmente não havia muro de separação da via com a rua, ou seja, enquanto havia duas pessoas pagando a tarifa de forma correta, cerca de dez ou mais “cidadãos” invadiam a via pelo resto de muro, que aparentemente foi derrubado,  pulando a plataforma. Além de ser algo que foge de um ato de um cidadão honesto, e o perigo de um trem de se aproximar e atropelar todos que estavam na via? Realmente algo que assusta os desavisados. 


Nesse quesito estação, a CPTM sai em vantagem por ter 52 das 94 estações acessíveis, entre as que possuem elevadores e sem contar as que possuem ao menos rampas de acesso, em sua maioria bem conservada, além de ter aberto 12 novas estações desde que assumiu integralmente o sistema em 1996, sem considerar as estações reconstruídas.
No caso da Supervia, das 102 estações operantes, bem poucas possuem itens de acessibilidade, quase todas encontram-se em um péssimo estado de conservação, e quase não abriu novas estações, apenas reconstruindo algumas e fechando outras. Não obtivemos dados sobre as novas estações, embora recentemente a empresa reabriu estações antes desativados.

Frota
Até o dia do fechamento dessa matéria, a CPTM havia em sua frota 204 composições operando. Desse total, apenas duas séries não possuem ar condicionado e são as séries mais antigas do sistema. São elas, a série 1700, fabricada em 1987, e a série 5400, antiga frota 5000 fabricada em 1978 e reformada em 2014.
Ao longo dos quase 27 anos que serão completados em Maio, a CPTM adquiriu 219 novas composições desde 1998, quando comprou a primeira nova série da sua frota: A série 2100, frota usada da espanhola Renfe. Desde então a estatal vem a muito custo renovar sua frota, que era tão sucateada ao assumir a malha da extinta RFFSA e Fepasa, que gerou a péssima fama dos trens que acompanharia a CPTM, mesmo nos dias atuais.
Trem série 4400: unidades restantes foram desativadas recentemente.
Autor: Victor Santos.
Em 20 anos, a CPTM reformou as séries mais antigas como as séries 1100, 1400, 1700, 4400, entre outras. Porém, nos últimos oito anos, boa parte das frotas herdadas de operadoras antigas foram retirados de circulação, dando o lugar para as frotas mais novas e modernas como as séries 2000, 7000, 8000, 9000, entre outras. Somente na última grande compra da empresa, foram 65 novos trens que foram divididos em duas séries: A série 8500, sendo 35 unidades fabricadas pela CAF, e a série 9500, 30 unidades restantes fabricadas pela Hyundai-Rotem. 
Comprados em 2016, agora quase três anos depois, quase todos os novos trens foram entregues, faltando apenas oito trens. 
Há ainda a série 2500, comprados para mais nova linha da companhia, a 13 Jade, inaugurada em abril de 2018. Esperasse que as oito unidades, que serão fabricadas pela chinesa CRRC, e estão em processo de testes pela companhia, embora já possuindo uma unidade entregue.
Trem série 9500, a mais nova serie da CPTM.
Autor: Yuri Gabriel
A SuperVia ao longo dos quase 21 anos em operação nos trens urbanos adquiriu cerca de 100 novos trens, sendo que a empresa tambem assumiu trens herdados da Flumitrens, sucessora da RFFSA/CBTU e antecessora da Supervia. O compromisso de concessão que o governo do Estado do Rio de Janeiro fez a Supervia era de que a operadora reformula-se a frota operante, e garantisse o conforto aos passageiros. 
Contudo, somente em 2005 é que a operadora comprou novos trens para sua frota, a série 2005 fabricada pela coreana Rotem em 2006, e depois de muito tempo é que se reformou algumas séries operantes, com recursos próprios.
Trem da série 2005 estacionado em Santa Cruz.
Autor: 
Ao assumir o sistema, em 1998, haviam trens elétricos e trens movidos a diesel que operava em ramais antigos que não foram modernizados. Muitas dessas séries são mais antigas que as séries que operavam na CPTM, e até os dias atuais ainda operam na Supervia, embora não sejam mais a maioria. 
A SuperVia até tentou reformar a série 700 para receber ar condicionado e poder operar por mais algum tempo, algo que ficou caro e não ficou tão bem feito.
Com grandes eventos que iriam acontecer no Rio, o governo do Estado adquiriu novos trens para a operadora. Ou seja, mesmo sendo uma empresa privada, para modernizar sua frota, teve que recebe ajuda do Estado. Não que isso seja um problema, mas para quem defende menos Estado e mais privatização...
Trens séries 500 (à esquerda) e 3000 (à direita).
Contraste grande do atual com o antigo.
Autor: Victor Santos.
Novamente, a CPTM sai em vantagem por ter atualmente a frota mais nova que a empresa carioca, ter adquirido mais trens novos ao longo dos anos e, dentro dos limites, ter uma frota relativamente conservada. Em contrapartida, a Supervia possui uma frota ainda antiga, mal conservada, mesmo na frota mais nova.

Conservação da via
Para o usuário comum, isso é menos perceptível ao primeiro olhar, mas para os mais técnicos, a conservação da via é tão importante quanto tudo. 
Por ter herdado um sistema sucateado de suas antecessoras, a CPTM teve uma difícil missão de recuperar suas vias férreas. Trocar trilhos, dormentes, sinalização, entre outros itens para garantir melhor instabilidade, segurança e conforto aos passageiros. O reflexo de anos de descaso por parte do poder público com as ferrovias paulistas são sentidas até os dias atuais, com interdições diárias da CPTM em algumas linhas para que obras de manutenção e modernização possam ser feitas.
A companhia Paulista refez trechos e faz a manutenção da via sempre.
Autor: Victor Santos.
Embora para os passageiros da companhia Paulista isso significa um atraso na viagem, pensem que para garantir melhores velocidades e mais segurança, isso é necessário. Em dias sem anomalia no sistema, dificilmente se encontra problemas nas vias que prejudiquem a segurança. Claro que há as restrições em alguns trechos, mas nada que realmente seja tão prejudicial.
Problemas com a via permanente é ainda relatado ate hoje.
Autor: Victor Santos. 
Na Supervia, se você olhar atentamente os trilhos, vai perceber a deterioração da via permanente. Dormentes rachados, trilhos com inúmeros problemas e sujeira são facilmente encontrados ao longo dos ramais da empresa. Com tantos problemas, não é incomum ouvir muito barulho vindo dos trens devido a péssima conservação dos trilhos. 
Segundo relatos de passageiros, as coisas mudaram de forma tímida nos últimos anos, sem realmente resolver problemas sérios. Os investimentos são prometidos há anos e até o momento a Supervia não conseguiu se modernizar a ponto de resolver os problemas herdados.
Em uma das viagens feitas na empresa, a irregularidade da via fez com que as vezes as pessoas pulassem em seus assentos. Isso porque mesmo com a via irregular, a velocidade era alta o suficiente para causar solavancos.
Novamente, a estatal Paulista está avançada nesse quesito quando comparada com a empresa carioca. Mesmo com os problemas burocráticos para os investimentos, a CPTM conseguiu resolver muito dos problemas que herdou das companhias antigas.

Linhas e ramais
A CPTM possui atualmente sete linhas em operação, totalizando 273 quilômetros de rede. No passado, havia desde a melhor linha até a pior linha e mais evitada pelos passageiros. 
A linha 9 Esmeralda, zona Sul, era considerada a melhor linha no quesito estações e trens, onde a maioria foi construída pela CPTM no início dos anos 2000. Enquanto isso, na zona Leste, a Linha 12 era considerada a pior linha, desde os trens antigos e com péssima conservação, até as vias e estações completamente precárias. Nos dias atuais, a Linha 12 melhorou muito no quesito trens e estações, tendo apenas duas das 13 estações sem acessibilidade, além de toda a frota possuir ar condicionado. 
Em 2018, a CPTM inaugurou a Linha 13 Jade, ligando a estação Engenheiro Goulart até a estação Aeroporto-Guarulhos, com 13 quilômetros. Depois de 10 anos sem inaugurar novos trechos, sendo a última extensão entregue foi a volta da linha 9 ao Grajaú em 2008, a companhia se expandiu, embora timidamente, ao longo da sua história. 
Está em obras também a extensão da Linha 9 para o bairro de Varginha, adicionando 4,5 quilômetros ao sistema.
Mapa da rede metropolitana de São Paulo.
Sim, uma rede conectada e integrada.
Fonte: CPTM.
Atendendo à 23 municípios, sendo três fora da Grande São paulo, a companhia se tornou muito importante para os deslocamentos para a capital ou entre as cidades atendidas, mesmo com os problemas diários. A CPTM tornou-se um transporte mais rápido e barato para os cidadãos de cidades mais afastadas da capital, sobretudo em comparação com os ônibus metropolitanos.
A carioca SuperVia possui atualmente possui cinco ramais, três extensões e 104 estações em operação, vale lembrar que as linhas funcionam como ramais, onde o ponto de partida é a estação Central do Brasil. Atende à 12 municípios da Região Metropolitana do Rio de Janeiro.
A rede se manteve ao longo dos anos a mesma desde herdou as linhas, não expandindo sua malha além da existente. Houve a reativação de trechos antes desativados como a linha de Guarapimirim, com trens movidos a diesel e carros de passageiros em péssimas condições. 
Talvez o fato da Supervia não ter se expandido seja o fato de atender Boa parte das cidades da baixada fluminense, e pelo fato de priorizar a modernização do sistema atual. Se abrimos o mapa do Rio de Janeiro, as linhas da Supervia se “espalham” pela cidade, cercada por morros. Há duas linhas em estudos para serem construídas: A extensão entre Santa Cruz e Itaguaí, trecho atualmente desativado, e a Linha Barrinha, entre Japeri e Barrinha.
Mapa da rede da Supervia.
Fonte: Supervia.
Demanda atendida
São Paulo e a região metropolitana somam juntas cerca de 21 milhões de habitantes, enquanto a Grande Rio soma cerca de 12 milhões de habitantes. A CPTM atende a 20 dos 39 municípios da RMSP, ainda atendendo a três cidades que não compõe a região metropolitana, como Jundiaí, Campo Limpo Paulista e Várzea Paulista. Segundo dados, a CPTM leva diariamente cerca de 2 milhões de passageiros. Durante os acontecimentos dos anos 1990, a companhia transportava com a mesma malha problemática cerca de 900 mil passageiros, hoje levando quase o triplo da demanda.

A SuperVia ao assumir os trens do subúrbio no Rio, transportava 145 mil passageiros por dia, pois a gestão da RFFSA era decadente. Nos dias atuais, a empresa carrega 670 mil passageiros diários, um número considerado por muitos baixo pela extensão atendida. Atende 12 dos 21 municípios da Grande Rio, e todas as cidades possuem ligações por ônibus com a capital, o que para muitos passageiros é viável dado a ineficiência no atendimento da empresa. 
Essa comparação é mais para exemplificar que a estatal Paulista aumentou sua capacidade ao longo dos anos, e mesmo que a Supervia também tenha aumentado sua capacidade, não foi o esperado pela empresa. Mesmo que cada cidade tenha suas próprias características, demandas e problemas, a comparação é válida quando levado em consideração o fato da Supervia ser o único exemplo de concessão do modal ferroviário de trens metropolitanos.

Serviços diversos
Caixas eletrônicos, quiosques de lanchonetes, sanitários, e máquinas de recarga de bilhetes, fazem parte desse quesito.
A CPTM possui ao menos uma máquina de recarga em suas estações, com exceção das paradas Amador Bueno e Santa Rita, além da bilheteria. Quiosques de lanchonetes ou conveniência estão sendo implantadas aos poucos em estações de maior movimento, sobretudo nas que possuem integração com o metrô. Também com exceção das paradas Amador Bueno e Santa Rita, todas as estações possuem sanitários disponíveis para o público. Porém, não existe máquinas de autoatendimento 24 horas em suas estações.
A SuperVia disponibiliza em algumas estações máquinas de recarga de bilhetes, não sendo em todas as estações. Quiosques de lanchonetes são bem difíceis de serem encontrados. Sanitários públicos são encontrados em quase todas as estações, mas o que surpreendeu foi que em algumas estações há caixas eletrônicos nos acessos da estações, mas encontrados nas que foram modernizadas.
Saguão da estação Central do Brasil:
Comércio abundante.
Autor: Victor Santos.
Imagem da empresa para o público
Quando alguém fala em CPTM para uma pessoa que andou em trens há dez anos ou mais, a primeira coisa que surge na mente da pessoa é “trens velhos, sem ar condicionado, assaltos, ambulantes, ou falhas”. Esse tipo de imagem que as pessoas têm da companhia surgiu no passado pelo fato da malha assumida pela estatal em 1992 ser muito precária. Tanto que a CPTM só resolveu a questão das viagens de pessoas penduradas nos trens e viagens com portas abertas em meados dos anos 2000. 
Nos dias atuais, a CPTM não sente mais tantos os efeitos da malha sucateadas que recebeu, mesmo com os problemas recorrentes. Não a toa que a demanda aumentou nos últimos 20 anos, graças a mudança de imagem que a empresa trouxe com as reformas das estações, obras de melhorias e novos trens comprados. Hoje em dia é mais fácil convencer um passageiro trocar os ônibus pela CPTM em casos de grandes distâncias ou tarifas. Embora a estatal precise melhorar mais para continuar prestando melhores serviços a população, a superlotação dos trens não é mais argumento para que os passageiros desistam de viajar nas linhas, mesmo porque o intervalo das linhas no geral não ultrapassam os 10 minutos nos horários de pico.
CPTM conseguiu resolver muito dos problemas que herdou.
Autor: Yuri Gabriel.
A SuperVia ainda tem um longo caminho a trilhar, a imagem da empresa ainda é vinculado à falhas de trens, superlotação, insegurança, trens velhos e estações péssimas no atendimento. Presenciamos relatos de altos intervalos dos trens em pleno pico, falhas recorrentes e a falta de trens reservas. 
Aliás, muitos relatos negativos são facilmente encontrados na página da empresa nas redes sociais. Recebemos alertas sobre a insegurança no sistema, evitar determinadas linhas e estações, inclusive os passageiros davam opções por outros modais, ônibus ou metrô. A SuperVia não conseguiu se distanciar dos problemas da falta de gestão da RFFSA nos anos 1990, sendo hoje seu calcanhar de Aquiles.
Recentemente a empresa passou a possuir a chinesa Mitsui como maior acionista, posto antes ocupado pelo grupo Odebrecht, que reduziu suas ações de cerca de 70% para pouco mais de 11%. O grupo atual de maior participação acionária é o GUMI - Guarana Urban Mobility, pertencente ao grupo Mitsui.
Por fim, basta perguntar a algum carioca que visitou a cidade de São Paulo e a CPTM, muitos dirão que a Paulista presta um atendimento muito melhor, enquanto a carioca passe a sensação de insegurança nos trens e estações.
Mesmo com investimentos, imagem da empresa ainda é vinculada a falhas e insegurança.
Autor: Victor Santos. 
Integração com outros sistemas
Em São Paulo hoje, quem sai de Mogi das Cruzes em direção a Praça da República pode utilizar os trens da CPTM até a estação Brás e depois embarcar nos trens do Metrô-SP sem pagar uma tarifa a mais, integração gratuita. O usuário também pode acessar as linhas 4 e 5 do metrô, administradas pelas empresas Via Quatro e Via Mobilidade respectivamente. O conceito de rede é verdadeiramente certo, pois o passageiro não precisa pagar duas tarifas para trocar de linhas ou empresas. Seis estações permitem transferência gratuita entre os sistemas de metrô e trens da CPTM, sendo apenas duas com esquema diferencial de horário para integração. 
Há integração com os ônibus municipais de São Paulo, ou com de outras poucas cidades também ocorre, sendo necessário pagamento apenas de um complemento da tarifa cheia. Isso funciona também para os ônibus intermunicipais administrados pela EMTU-SP.
Se brinca dizendo que o passageiro pode andar em toda região metropolitana de São Paulo pagando apenas uma tarifa, ou andar a cidade de São Paulo inteira de ônibus e metrô com apenas R$7,65.
Transferência livre entre metrô e trens da CPTM.
Seis estações do sistema permitem transferência gratuita.
Autor: Via Trólebus, clique para ver fonte.
No Rio de Janeiro, chega a ser estranho para uma cidade tão visada não ter tantas integrações entre os sistemas. Por exemplo, o passageiro que quiser chegar de trem na estação Maracanã e quiser seguir de metrô deverá pagar um valor adicional para integrar-se a linha de metrô. Mesmo que a estação Maracanã, onde haveria uma integração física e podendo haver a integração gratuita, não há uma integração como há em São Paulo. Chega ser estranho haver duas estações lado a lado sem uma integração ao menos física descente.
Acesso da estação Maracanã da Supervia.
Autor: Victor Santos.


Acesso da estação Maracanã do MetrôRio.
Autor: Victor Santos
Embora haja integração tarifada com ônibus intermunicipais, é pouco para o tamanho da necessidade. A situação é pior quando o passageiro quer utilizar os trens do VLT Carioca, onde não há integração nem tarifária, mesmo com uma das paradas ao lado da estação Central do Brasil.
O motivo pelo qual talvez não haja integrações mais decentes no Rio de Janeiro seja pelo fato de cada sistema ser administrado por empresas diferentes. A Supervia possui um grupo administrando ela, o Metrô Rio é outra empresa, o VLT por outra, e os ônibus municipais e intermunicipais gerenciados pelos respectivos órgãos e operados por empresas privadas. Diferente de São Paulo, onde o governo fez um contrato de concessão das linhas 4 e 5 que prevê a integração entre os sistemas, no Rio isso parece utópico, já que deveria haver quesitos nos contratos de concessão que permitam a livre transição pelos sistemas.

Comparação em dados
A CPTM possui 94 estações, sete linhas, 204 composições, atende a cerca de 2 milhões de passageiros por dia em 23 cidades. A CPTM é uma estatal de economia mista criada a partir da lei número 7.861 em 28 de maio de 1992, assumindo o sistema ferroviário existente. O intervalo médio das linhas gira entorno de 4 a 10 minutos nos picos.
A Supervia possui 102 estações, oito linhas, cerca de 200 composições que atendem a 510 mil passageiros por dia em 12 municípios. Fundada em 01 de novembro de 1998, após vencer a licitação na qual o Consórcio Bolsa 2000, hoje é administrado pela Odebrecht. O intervalo médio entre os trens fica entorno de 4 a 30 minutos, isso sem contar algumas extensões operacionais que podem chegar a uma hora ou mais de intervalo.
Tabela com dados das empresas.
Elaborado por Thiago Silva (Plamurb)
Fonte: Plamurb
Conclusão
Por mais que a CPTM seja uma estatal que está sujeita a interesses políticos e pode sofrer com falta de verbas, ao longo dos anos a companhia vêm demonstrando um avanço técnico em muitos quesitos, sobretudo com relação frota operacional. Os investimentos foram feitos e hoje o número de falhas ou interrupções diminuiu drasticamente se comparar o sistema de 20 anos atrás, aumentando a confiança dos passageiros. 
Já a Supervia, que por ter uma administração mais enxuta e livre do poder político, em tese, ainda precisa de muito mais investimentos para melhorar suas estações, trens, vias e a sua própria imagem que o público tem. A confiança aumentou, porém a empresa foi atingida pela crise que abalou o Estado e a sua própria gestão. Ouvi muitos relatos de que a Supervia hoje, é a CBTU em São Paulo no passado, onde existe a operação com trens precários e estações com aspectos de abandono.
Você que leu essa análise pode levar o texto para um lado político, mas tudo que foi visto no Rio de Janeiro pelos trilhos da Supervia é o que os cidadãos cariocas passam diariamente. Se por um lado a Supervia ganha em administração mais dinâmica e sem burocracia, perde na operação para a CPTM.
Acima, trem da CPTM na estação Luz (autor: Yuri Gabriel)
Abaixo, trem da Supervia na Central do Brasil (autor: Victor Santos).


Fontes: Plamurb, CPTM, Supervia. 
Autor: Victor Santos.
Veja também a reportagem do Plamurb sobre a Supervia clicando aqui.

sexta-feira, 6 de março de 2020

Trem São Paulo - Rio: o traçado entre as duas capitais

Mais de 20 anos se passaram desde que o último “Trem de Prata” circulou entre São Paulo e o Rio de Janeiro, quando em 31 de outubro de 1998 o serviço foi encerrado, marcando o fim de uma era na história das ferrovias. Encerrava ali uma das ligações ferroviárias mais prestigiadas entre duas grandes capitais, que se desenvolveram através das próprias ferrovias.
Embora ainda ativo para os trens de carga da concessionária MRS Logística, o percurso sofreu diversas alterações devido as retificações feitas ao longo da história, conectando-se à outras ferrovias ao longo do traçado. Conheça hoje o percurso entre as duas capitais, além das antigas ligações e como está atualmente.

Breve histórico
A cidade de São Paulo já contava com uma ligação ferroviária desde 1867, quando a Sao Paulo Railway abriu as operações entre Santos e Jundiaí, passando pela capital. A capital do Rio de Janeiro também possuía suas ferrovias, como a primeira ferrovia do Brasil, a Estrada de Ferro Mauá de 1854, e a Estrada de Ferro Dom Pedro II, que partia do Rio de Janeiro em direção à Província de Minas Gerais, isso em 1864.
Com a produção do café na região avançava em direção à Província de São Paulo, se afastando cada vez mais da região portuária do Rio de Janeiro e se aproximando do Vale do Paraíba, havia uma região entre as duas Províncias que não era coberto por nenhuma ferrovia.
Então em meados de 1860, fazendeiros da região começaram a propor uma ligação férrea entre São Paulo e Cachoeira, atual Cachoeira Paulista. Essa ligação, denominada de Estrada de Ferro do Norte ou Estrada de Ferro São Paulo – Rio, pretendia escoar a produção da região através de duas ferrovias já existentes: Em Cachoeira com a então Estrada de Ferro Dom Pedro II, que chegou na região em 1875, e em São Paulo com a Sao Paulo Railway através da estação “Braz”, de onde a linha para Cachoeira partiria. Além disso, a ferrovia se conectaria com o terminal navegável de Cachoeira.
Estação do Norte (atual Brás) da E.F. do Norte.
Autor: Desconhecido, fonte: Estações Ferroviarias do Brasil.
O percurso total foi entregue em 08 de julho de 1877, partindo da então estação “do Norte”, em São Paulo, e seguindo pelo que é hoje a Zona Leste de São Paulo, percorrendo o Alto do Tietê, chegando ao Vale do Paraíba através da cidade de Jacareí, onde ela segue até Cachoeira, totalizando cerca de 230 quilômetros de percurso.
A ferrovia tinha tudo para ir bem, mas o alto custo da baldeação em Cachoeira, uma vez que se tratava de ferrovias diferentes, causou uma decadência muito rápida da ferrovia, sendo ela comprada e incorporada à Estrada de Ferro Dom Pedro II já em 1896. Em 1889, a Estrada de Ferro Dom Pedro II mudou de após a queda do Império, passando a se chamar Estrada de Ferro Central do Brasil, com a sigla EFCB, desde então. 
A Central do Brasil iniciou as obras para a retificação da linha da antiga Estrada de Ferro do Norte, alargando a bitola de 1.000 mm para 1.600 mm, além de refazer alguns trechos. A primeira parte da obra foi entregue em 1901, contemplando o trecho entre Cachoeira e Taubaté, sendo inaugurado em 1908 o percurso completamente refeito até São Paulo. Uma curiosidade é que não havia uma ligação entre uma ferrovia e outra, sendo a baldeação feita através de balsas entre as margens do Rio Paraíba do Sul, questão essa resolvida somente em 1890.
Estação de Barra (atual Barra do Piraí) em 1881.
Autor: Colecção de 44 vistas photográphicas da Estrada de Ferro Pedro II.
Fonte: Estações Ferroviárias do Brasil. 
O Ramal São Paulo, como era chamado a ligação de Barra do Piraí até Cachoeira pela Central do Brasil, passou a seguir até a capital de São Paulo, sendo até os dias atuais chamado por esse nome a ligação entre os dois Estados. Com isso, a companhia possibilitou interligar duas grandes capitais de forma mais direta, sendo responsável por mais da metade do tráfego nesse trecho até meados de 1930.
Em 16 de março de 1957 através da Lei n° 3.115, foi fundada a Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima, ou somente pela sigla RFFSA, que tinha como objetivo unificar e integrar as ferrovias em todo o país, centralizando todas como subsidiarias do Governo Federal. A Central do Brasil foi incorporada a RFFSA, embora muitos até os dias atuais ainda chamem estações e linhas de “ramais da Central”.
Estação Brás atualmente, com a gare da antiga da E.F. Central do Brasil.
Autor: Victor Santos, 2019.
Foi na década de 1990 que, com as políticas públicas voltadas para o transporte rodoviário e para o fim das estatais, os trens de passageiros foram perdendo forças e encerrando o transporte de passageiros em 31 de outubro de 1998, com a chegada do último “Trem de Prata” no Rio de Janeiro. A Rede Ferroviária foi dissolvida e sua malha concedida a iniciativa privada, sendo a MRS Logística a nova operadora no Ramal São Paulo e em parte da antiga malha da Central do Brasil.
Nas regiões metropolitanas de cada capital, o transporte de passageiros foi continuado, em São Paulo pela estatal paulista CPTM em 1992, e no Rio de Janeiro pela concessionária SuperVia no ano de 2000.
Estação Central do Brasil, no Rio de Janeiro.
Autor: Victor Santos, 2018.
Primeiro trecho aberto (1877 – 1896)
Partindo da estação do Norte, ao lado da estação “Braz” da SPR, a linha segue rumo ao Vale do Paraíba cruzando pela região leste de São Paulo, o que originou a formação de muitos dos distritos que existem hoje, onde inicialmente eram fazendas ou vilarejos distantes do centro de São Paulo. Os distritos formados a partir da construção da ferrovia e, através da sua valorização econômica, compõem a Zona Leste de São Paulo em partes, como Itaquera, Vila Matilde, Penha, Guaianases e José Bonifácio.
Seguindo para fora do município de São Paulo, a linha percorre por locais onde hoje formam as cidades de Ferraz de Vasconcelos, Poá e Suzano, na época ainda distritos ou vilas pertencentes a Mogi das Cruzes. Saindo de Mogi das Cruzes, a linha se aproxima do Rio Tietê nesse ponto, onde atravessa ele e começa a deixar a região do Alto do Tietê. Ao chegar na região onde atualmente é a cidade de Guararema, emancipada em 1898, a ferrovia atravessa pela primeira vez o Rio Paraíba do Sul, onde inclusive foi fundada a estação “Parahyba” que mais tarde foi renomeada para Guararema.
Em Jacareí, a ferrovia percorre pelo centro da cidade já formada naquela época e já no Vale do Paraíba, percorrendo cada vez mais sentido leste do Estado.
Uma curiosidade é que na chegada a São José dos Campos, o ramal original passava pela região central da cidade, fazendo curvas muito fechadas, que causou um grande acidente em 1915, já sob domínio da Central do Brasil. No dia 19 de setembro de 1925, após muitas relutâncias por parte da cidade na inauguração da variante, a EFCB entregou a nova estação e a nova linha, que agora passava por fora da cidade, em um local menos habitado e com curvas mais suaves em relação ao original. A antiga estação foi demolida, assim como o percurso original foi desmanchado, não restando absolutamente nada que fizesse lembrar que existiu uma linha pela região.
Mapa do traçado original (de 1877) e o
 traçado de 1925.
Autor: Victor Santos, 2020.
Por fim, após sair de São José dos Campos, a ferrovia seguia pelas cidades de Caçapava, Taubaté e Pindamonhangaba.
Em Roseira, a estação original foi fundada em março de 1877, mas a região ainda pertencia a cidade de Guaratinguetá, que posteriormente perde o território de Aparecida, que passou a administrar a região de Roseira, que se tornou um distrito em 1944 e se emancipa de Aparecida em 1965.
O distrito de Aparecida já existia desde 1842 quando a ferrovia se estabeleceu na região, que recebeu uma estação no local e na parte central da cidade, até então Guaratinguetá. Com a importância de Aparecida crescendo com o turismo religioso, a região se emancipou de “Guara”, como é chamado pelos moradores da região, tornando Aparecida uma cidade em 1929. Mesmo assim, Guaratinguetá ainda permaneceu com sua estação, inaugurada em 1877 também.
Seguindo beirando as proximidades do Rio Paraíba do Sul, a linha continua o percurso, cruzando a cidade de Lorena, Canas (emancipada de Lorena em 1993) e por fim chegando à Cachoeira, encerrando o percurso original de cerca de 230 quilômetros desde São Paulo.
Percurso original da E.F. do Norte (1877)
Autor: Victor Santos, 2020

Após a incorporação com a Estrada de Ferro Dom Pedro II
Com a aquisição da Estrada de Ferro do Norte pela Dom Pedro II, a nova administração iniciou pouco tempo depois a reformulação de todo o ramal até São Paulo, trocando a bitola que a antiga operadora usava de bitola métrica, de 1.000 mm, para bitola larga, de 1.600 mm, que era usada pela nova companhia. Com isso, a baldeação entre as duas companhias em Cachoeira seria eliminada e o custo para o transporte seria reduzido, mas para outros fins já que o café não era mais o principal foco das ferrovias naquela época.
A obra total foi entregue em 1908, quando a Estrada de Ferro Dom Pedro II já se denominada Estrada de Ferro Central do Brasil após a queda do império, onde após alguns anos iniciou uma reforma geral nas estações do Ramal de São Paulo. Com a incorporação, o marco zero da ferrovia foi transferido de São Paulo para o Rio de Janeiro, ou seja, São Paulo não era mais o inicio deste ramal, sendo agora a cidade do Rio o ponto inicial da ferrovia.
Todas as estações originais, com exceção da estação de Cachoeira, foram reformuladas e receberam prédios com arquitetura estabelecida pela Central naquela época, o que pode ser notada pela similaridade entre os prédios das estações das cidades de Lorena, Aparecida, São José dos Campos e Jacareí. Com os trens ligando diretamente as capitais São Paulo e Rio de Janeiro, tornou-se uma das linhas mais rentáveis da Central, sobretudo no transporte de passageiros.
Entre 1896 e 1957 muitas cidades cresceram e se emanciparam com o desenvolvimento trazido pela ferrovia e tornando o Vale do Paraíba o que ele é hoje. Basicamente, podemos dizer que todo o desenvolvimento cultural, social e industrial da região foi, de alguma forma, influenciado pela ferrovia estabelecida em 1877.
Com todo esse avanço, não demorou para que outras ferrovias fossem construídas para se interligar com o ramal. Tais como:
-Estrada de Ferro Minas e Rio: Fundada em 1884, a linha partia da estação de Cruzeiro e seguia até Jurema, passando por cidades como Três Corações e Varginha, em Minas Gerais. O ramal está parcialmente ativo em alguns trechos, mas o tráfego de passageiros regular se encerrou na década de 1980.
-Estrada de Ferro Campos do Jordão: Inaugurada em 1914 com o intuito de levar pacientes até a cidade de Campos do Jordão, no alto da Serra da Mantiqueira, a ferrovia partia de uma estação própria próximo da estação de Pindamonhangaba do Ramal de São Paulo. Permanece ativa até os dias atuais.
-Estrada de Ferro Bananal: Construída em 1882, a linha partia da estação Saudade, em Barra Mansa, no Ramal São Paulo e seguia para a cidade no extremo leste do Estado de São Paulo, embora tenha chegado à cidade somente em 1888. Passou a pertencer a Central do Brasil em 1931, sendo extinto em 1964.
-Estrada de Ferro Lorena – Benfica: Projetada para atender ao Exército Brasileiro, o ramal partia da estação de Lorena em direção a Piquete, ainda em São Paulo. O ramal passou a pertencer a Central em 1921, e foi desativado em meados de 1970.
Além disso, em Barra do Piraí, havia um enorme centro de conexões entre linhas férreas, onde o Ramal de São Paulo encontrava com a “Linha do Centro” da Central, que partia do Rio de Janeiro em direção ao Estado de Minas Gerais, onde, através de muitos outros ramais férreos, a linha chegava as margens do Rio São Francisco, divisa com a Bahia.
O Ramal de São Paulo chega a estação Dom Pedro II, atual Central do Brasil, através da própria “Linha do Centro”, atravessando a Serra das Araras, descendo em direção ao litoral fluminense, onde ainda se encontra com a “Linha Auxiliar” da Central, antiga Estrada de Ferro dos Melhoramentos, na cidade de Japeri, onde a ferrovia chega no trecho urbano do Rio de Janeiro.
Traçado após a incorporação pela E.F. Dom Pedro II.
Autor: Victor Santos, 2020.
Ramal São Paulo no Estado do Rio de Janeiro
Como já citamos, o Ramal São Paulo pela Estrada de Ferro Dom Pedro II partindo da “Linha do Centro” da companhia, na estação de Barra do Piraí, sendo entregue por completo até a região de Cachoeira Paulista em 1875.
Muitas das estações e paradas construídas entre Barra do Piraí e a divisa com São Paulo foram fundadas em terrenos de fazendeiros influentes nas regiões, uma vez que com a ferrovia, seria possível escoar a produção das fazendas de maneira mais ágil e barata. A linha parte da cidade de Barra do Piraí rumo a cidade do Rio de Janeiro usando ainda a “Linha do Centro” da antiga E.F. Dom Pedro II, onde chega ao litoral fluminense após descer a Serra das Araras sem o uso de equipamentos para auxílio, descia feita por aderência.
Já na baixada fluminense, a linha segue pelas cidades de Queimados, Japeri, até chegar no Rio de Janeiro.
Embora existissem viagens entre São Paulo e o Rio de Janeiro, o Ramal São Paulo iniciava somente em Barra do Piraí, utilizando estações e paradas da linha do Centro da Central do Brasil.
Ramal São Paulo, em 1875.
Autor: Victor Santos, 2020.
Gestão da Rede Ferroviária Federal
Em 1957, o Governo Federal iniciou os planos de centralizar as operações de todas as antigas estradas de ferro em operação naquela época, dando início as operações da Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima, ou como ficou conhecida pela sigla RFFSA.
Na verdade, com as políticas de valorização da indústria automobilista na gestão do presidente Juscelino Kubistchek, as ferrovias se tornaram deficitárias, com enormes prejuízos, falta de investimentos em manutenção e ampliação, além da concorrência com o modal rodoviário em muitas rotas. Com isso, o governo observou que centralizando as operações das ferrovias, poderia diminuir os problemas de falência das estradas de ferro.
A Central do Brasil foi incorporada pela RFFSA logo em 1957, assumindo as operações dos trens cargueiros, de passageiros de longo curso e do transporte urbano nas regiões de São Paulo e Rio de Janeiro. Em 1984, criou a Companhia Brasileira de Trens Urbanos para assumir as operações dos consecutivos trens de passageiros nas regiões urbanas, sendo ela uma subsidiária direta da RFFSA.
A estatal refez alguns trechos do ramal para melhorar a fluidez dos trens e diminuir o tempo de percurso, retificações feitas nos seguintes trechos:
  • Taubaté à Pindamonhangaba, excluindo o distrito o Quirim e a cidade de  Tremembé do mapa da linha.
  • Cachoeira Paulista à Cruzeiro, onde a linha percorre agora pela margem direita do Rio Paraíba do Sul, cruzando com ele apenas na chegada em Cruzeiro. O ramal antigo foi desativado e demolido, restando apenas uma antiga ponte ferroviária na cidade de Cachoeira Paulista, sob o rio.
  • Queluz à Engenheiro Passos, onde uma variante nova foi construída entre as duas divisas estaduais.

Variante de Parateí
Com o aumento do tráfego de trens entre o Rio de Janeiro e São Paulo, tornou-se necessário uma melhoria no percurso do Ramal São Paulo, sobretudo nas curvas. Entre São José dos Campos e São Paulo, as cidades haviam crescido e o tráfego de trens a cada momento começou a gerar problemas, tanto para a ferrovia quando para o transporte rodoviário. Com isso, a velocidade no trecho era menor e a capacidade de tráfego também por consequência.
Em meados de 1940, foi iniciado a construção da Variante de Parateí, uma nova linha que partiria da estação Manoel Feio, na Variante de Poá da Central, em direção à São José dos Campos, onde voltava a se encontrar com o ramal principal. Encurtando o percurso em 11 quilômetros, a Variante foi entregue em 1952, com uma linha passando por fora dos centros das cidades de Suzano, Mogi das Cruzes, Guararema e Jacareí, embora ainda mantivessem a operação dos trens nestas cidades.
Este ramal possui pequenas paradas que servem de apoio aos trens cargueiros, dominantes no trecho desde 1998, quando o Trem de Prata, que usava a Variante no percurso para o Rio de Janeiro, foi encerrado.
Passou a ser a única forma dos trens seguirem de São Paulo para o Vale do Paraíba, uma vez que o ramal original foi parcialmente desativado entre Jacareí e São José dos Campos, tendo seus trilhos retirados na região central de Jacareí, mas ainda em uso partindo de São Silvestre, distrito de Jacareí, em direção a capital paulista.
Variante de Parateí e o ramal antigo.
Autor: Victor Santos, 2020.

O que sobrou da ferrovia original?
Atualmente, sob concessão da MRS Logística, boa parte das estações originais, tanto da antiga Estrada de Ferro do Norte quando da Central do Brasil, estão, em sua maioria, abandonadas ou até demolidas parcialmente. Como a concessão não foi devidamente específica sobre o uso das estações, que até então pertenciam a RFFSA, algumas foram usadas pela MRS como escritórios de operações ou apoio aos trens, enquanto outras foram abandonadas ao lado da via utilizada pelos trens de carga.
Estações como Aparecida, Guaratinguetá e Guararema hoje pertencem a suas respectivas prefeituras, que usam as estruturas como central de eventos, museus ou pontos turísticos, mantendo inclusive o prédio original de pé e conservado.
Embora sem trilhos, as estações de Tremembé e Jacareí ainda continuam em uso pelas suas prefeituras, mantendo a arquitetura original de quando foram construídas pela Central. Alias, uma curiosidade é que a cidade de Tremembé entrou no mapa da Central apenas em 1914, quando a companhia comprou uma linha de tramway que existia entre a cidade e o Ramal de São Paulo. Posteriormente, com uma retificação na linha entre Taubaté e Pindamonhangaba, a linha deixou de atender Tremembé pela região central, sendo eliminado do percurso mas mantendo a estação, que continua até hoje como centro cultural.
Fachada da estação de Cachoeira Paulista.
Autor: Victor Santos, 2020.
De original mesmo da antiga Estrada de Ferro do Norte é o prédio da estação de Cachoeira Paulista, que adotou esse nome em 1948 tanto para a cidade quanto para a estação. Durante um período na década de 1940, o nome do município e estação era Valparaíba.
A estação sempre foi a maior e mais imponente, sendo vista de muitas partes da cidade e sendo também uma das mais próximas do Rio Paraíba do Sul. Com uma arquitetura muito comum na época, sua estrutura encontra-se em completo abandono e em vias de ser erradicada, uma vez que tanto a MRS quando a prefeitura não cuidaram da estação desde o fim dos anos 1990. Visitamos a estrutura da estação em novembro de 2018, e o que se pode encontrar é vestígios do que um dia foi uma estação grandiosa, importante e em uso. Há um bairro entorno da linha e da estação, e os moradores parecem se acostumar com uma estrutura tão imensa sem uso e abandonada.
Estação de Guararema, restaurada e em como centro turístico.
Autor: Victor Santos, 2020.
A estação fica ao lado da linha, com uma plataforma as margens da via que, constantemente tem o tráfego de trens indo e voltado para São Paulo.
A construção da Estrada de Ferro São Paulo – Rio original permitiu que mais passageiros trafegassem entre as cidades do Alto do Tietê até a capital, tornando o trecho, mais tarde sob domínio da Central, entre Mogi das Cruzes e Roosevelt a “Linha Tronco” da companhia. Na década de 1930, a Central inaugurou a “Variante Poá”, uma linha com menos curvas e um percurso mais suave em relação a Linha Tronco. Essa se tornou, primeiramente, uma linha de trens do subúrbio, mais tarde em 1952 a principal saída de São Paulo rumo ao Rio com a Variante Parateí.
As atuais Linha 11 Coral, entre Luz e Estudantes, e 12 Safira, entre Brás e Calmon Viana (Poá), fazem, parcialmente, o antigo traçado das ferrovias extintas, mas que foram importantes para o crescimento econômico e social do Estado. Restará apenas a lembrança dos áureos tempos das ferrovias nos dois Estados do sudeste do país, que sempre serão marcados pelo desenvolvimento que as vias férreas os trouxeram.
Uma curiosidade final é que o "Trem de Prata" foi criado em 1994 para substituir o antigo trem "Santa Cruz", que fazia a ligação entre as duas capitais, tendo sido encerrado em 1991. O novo trem entre cidades partia da estação Barra Funda da extinta Fepasa, seguindo até a cidade do Rio de Janeiro sem paradas intermediárias e usando a Variante de Parateí no percurso. 
Estação de Queluz, última antes da divisa, sem uso.
Autor: Victor Santos, 2020.

Texto e revisão: Victor Santos e Gustavo Bonfate.
Mapas: Gustavo Bonfate e Victor Santos.
Referências: