TUE série 8500 estacionado na estação de Estudantes, Mogi das Cruzes. Trens da Linha 11 Coral fazem viagens diretas entre Luz e Estudantes. Foto: Victor Santos, 2020. |
No dia 17 de setembro de 2020, a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos, CPTM, anunciou oficialmente que a linha 7 Rubi teria uma mudança operacional muito esperada por milhares de passageiros. A linha passaria a contar com mais viagens diretas entre os terminais Brás e Jundiaí, antes com menos frequentes e com a necessidade de trocar de trem na estação de Francisco Morato na maioria dos casos.
Agora os trens da linha serão intercalados, com viagens diretas entre as duas extremidades e viagens até a estação Francisco Morato, excluindo em alguns momentos a necessidade de trocar de trem no meio do caminho.
Não é a primeira vez que a companhia determina o fim das extensões operacionais de suas linhas, e quais seriam os motivos para isso? Conheceremos hoje.
O que é e como surgiram as extensões operacionais?
As extensões operacionais, como o próprio nome sugere, são extensões de uma linha principal de trem para uma estação ou cidade onde a demanda ou estrutura não permitam viagens diretas desde o trecho principal. Normalmente nas extensões operacionais os trens são menores e os intervalos entre eles é maior devido a baixa demanda ou por outros motivos.
Historicamente falando, a primeira extensão operacional do transporte sobre trilhos em São Paulo surgiu em 1979, quando a extinta Fepasa (Ferrovia Paulista Sociedade Anônima) reconstruiu a então Linha Oeste da companhia. A partir de então, o trecho entre Júlio Prestes e Itapevi se tornou o “Trecho Principal”, onde ocorreu a reconstrução das estações do trecho, alargamento da bitola dos trilhos (de 1.000 mm para 1.600 mm) e a operação dos novíssimos trens da série 5000, de fabricação francesa e brasileira pela Francorail e Cobrasma, além de outras empresas.
Antes disso, na região metropolitana ainda não havia sido criado esse tipo de sistema, no máximo viagens parciais dentro dos trechos principais das próprias linhas.
TUE Toshiba estacionado em Amador Bueno. Foto: Estações Ferroviárias do Brasil, autor desconhecido. |
Já o trecho entre Itapevi e Mairinque, fora da Grande São Paulo, foi denominado como “extensão operacional” e contava com a operação de trens mais antigos e mais estreitos da companhia, o TUE Toshiba (posterior série 4800 da CPTM), uma vez que o investimento na troca de bitola e reconstrução de estações não avançou após Itapevi por não ser economicamente viável naquele momento.
Os passageiros que partiam de São Paulo com destino a Mairinque precisariam utilizar os trens do trecho principal até Itapevi, onde trocavam para o trecho entre Itapevi e Amador Bueno, com horários menos frequentes e estações ou paradas menores. Isso não valia para os trens de longo percurso (para o interior de São Paulo), que usavam as mesmas linhas.
O trecho Itapevi – Mairinque funcionava de forma irregular, com posteriores problemas ocasionados pelo baixo investimento, vandalismo e falta de segurança, ocasionando na diminuição da demanda e posterior corte nos horários. A linha nesse trecho era duplicada apenas até a parada Amador Bueno, enquanto o restante era em via singela com pátios de cruzamento nas paradas e estações.
Na década de 1980 possivelmente, a linha foi divida em duas: entre Itapevi e Amador Bueno, com mais horários, e Amador Bueno e Mairinque, com menos frequência. Em 1998, já durante a administração da CPTM (desde 1996), a linha após Amador Bueno foi desativada e posteriormente abandonada, embora ainda seja um trecho administrado pela companhia, mesmo abandonado atualmente.
Atualmente, o trecho que compreende as estações Itapevi e Amador Bueno é a extensão operacional da Linha 8 Diamante da CPTM, que foi reformulada entre 2010 e 2014, recebendo a bitola padrão da companhia (1.600 mm) e os reformados trens da série 5000 (agora 5400). A antiga série 4800 foi desativada e duas unidades ainda estão sob domínio da companhia.
Caso queira conhecer mais sobre essa extensão operacional, já fizemos uma matéria sobre. Acesse: Caminhos Perdidos - Trem metropolitano para Mairinque.
Mapa da rede de trens metropolitanos, aproximadamente 2001. Foto: Victor Santos, 2019. |
Do “lado leste” da Grande São Paulo, a então Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima (a RFFSA) administrava as linhas de trens urbanos nas regiões Norte e Leste da Região Metropolitana de São Paulo, além é claro dos trens de longo percurso. A partir de 1984 a subsidiária da RFFSA passou a operar as linhas, a CBTU – Companhia Brasileira de Trens Urbanos. A operação era dividida da seguinte forma:
Linha Noroeste – Sudeste: Entre Paranapiacaba e Jundiaí, parcialmente a linha Santos – Jundiaí da antiga São Paulo Railway e Estrada de Ferro Santos à Jundiaí.
Linha Tronco: Entre Roosevelt (atual Brás) e Mogi das Cruzes, parte da linha São Paulo – Rio de Janeiro da antiga Estrada de Ferro do Norte e Estrada de Ferro Central do Brasil.
Variante Poá: Entre Roosevelt e Calmon Viana (na cidade de Poá), antiga linha da Central do Brasil.
Após a CPTM assumir as operações da CBTU em São Paulo em 1994 e as operações da Fepasa em 1996, surgiram as seguintes extensões operacionais entre 1994 e 2000:
Linha A Marrom (atual 7 Rubi): Entre Francisco Morato e Jundiaí, deixando o trecho principal entre Luz e Francisco Morato.
Linha B Cinza (atual 8 Diamante): Entre Itapevi e Mairinque (depois somente até Amador Bueno), com o trecho principal entre Júlio Prestes e Itapevi.
Linha C Celeste (atual 9 Esmeralda): Entre Jurubatuba e Varginha, com o trecho principal entre Presidente Altino e Jurubatuba.
Linha D Bege (atual 10 Turquesa): Entre Rio Grande da Serra e Paranapiacaba, com o trecho principal entre Rio Grande da Serra e Luz.
Linha E Laranja (atual 11 Coral): Entre Guaianases e Estudantes, com o trecho principal denominado de “Expresso Leste” entre Guaianases e Brás (depois Luz). Essa extensão foi criada já na fase da CPTM após a criação do Expresso Leste em 2000.
Linha F Violeta (atual 12 Safira): Entre Roosevelt e Calmon Viana, ainda chamada por muitos de "Variante Poá".
Observação: A Linha G ainda estava em construção e posteriormente foi transferida para a Companhia do Metropolitano de São Paulo (Metrô-SP), se tornando a Linha 5 Lilás.
Budd 141 já sob administração da CPTM estacionado em Paranapiacaba. Foto: Vanderley Zago. Fonte: Estações Ferroviárias do Brasil. |
Por que algumas extensões operacionais foram encerradas?
Com o constante aumento na demanda de passageiros transportados, a companhia começou a tentar minimizar os impactos desse crescimento melhorando a dinâmica das linhas para atender as demandas. No início dos anos 2000, a companhia ainda não possuía uma frota maior e os poucos trens em operação não ofereciam a disponibilidade necessária para as operações diárias da empresa.
A primeira extensão operacional a ser extinta foi a da Linha C, pois não oferecia a segurança e operação confiáveis para os passageiros e operadores na época. A extensão foi inaugurada em 1992 ainda pela Fepasa de maneira provisória e irregular, pois o trecho principal chegava em Jurubatuba após a companhia reformar o antigo Ramal Jurubatuba da antiga Estrada de Ferro Sorocabana, inaugurada em 1957.
O antigo ramal encontrava a linha Mairinque – Santos da companhia em Evangelista de Sousa, extremo Sul da cidade de São Paulo, e teve suas operações para passageiros interrompidas em 1979, retornando em 1987 até Jurubatuba para os trens do subúrbio com bitola mista (larga e estreita) e novas estações.
Os trens que circulavam nesse trecho eram os antigos trens da série 4800, com bitola estreita e mais curtos (apenas três carros cada composição).
Problemas como falta de segurança, paradas sem a infraestrutura necessária, superlotação e altos intervalos ocasionados pela falta de duplicação do trecho, fizerem com que a companhia encerrasse a operação em dezembro de 2001.
Uma curiosidade dessa extensão operacional era que os passageiros poderiam viajar de graça entre Varginha e Jurubatuba, onde não era necessário fazer o pagamento de uma tarifa para seguir para o trecho principal (entre Jurubatuba e Osasco). Como já havia a precariedade no transporte coletivo sobre pneus naquela época, era comum a grande procura pelos trens desse trecho. Eram quatro estações no percurso, sendo Jurubatuba, Interlagos, Grajaú e Varginha.
Em 2002 a CPTM encerrou as operações da extensão operacional da Linha D entre Rio Grande da Serra e Paranapiacaba. Embora fosse um transporte importante para manter viva a história da antiga Vila Inglesa instalada próxima da descida da Serra do Mar, um dos motivos da desativação foi a baixa demanda do trecho em relação ao trecho principal entre Rio Grande da Serra e Luz.
Inicialmente os trens até Paranapiacaba, passando pela estação de Campo Grande, eram bem irregulares com apenas quatro partidas diárias no final da década de 1990, posteriormente apenas aos finais de semana algum tempo antes do encerramento.
Há também a restrição devido a concessão feita em 1998 para a MRS Logística, que detém as operações do trecho entre Ribeirão Pires e Santos, passando por Rio Grande da Serra e Paranapiacaba. A MRS administra os trens de carga no trecho, e para a CPTM continuar operando seria necessário um acordo da MRS. A CPTM já possui um acordo com a MRS para que os trens da concessionária utilizem parte da malha férrea da companhia paulista para passar os seus trens de carga (entre Ribeirão Pires e Jundiaí), além de partes de outras linhas que ela utiliza.
A CPTM possui uma rota para a vila de Paranapiacaba através do Expresso Turístico, entre Luz e Paranapiacaba passando por Santo André que relembra a história da primeira ferrovia do Estado de São Paulo, sendo a viagem mais procurada por turistas. A rota está paralisada atualmente devido a pandemia do Convid-19.
Visitamos o trecho após Rio Grande da Serra em junho de 2019, e o que podemos ver é que a rede aérea, necessária para que os trens elétricos da CPTM operar, foi parcialmente removida ou abandonada, o que inviabiliza as operações. Isso, associado a baixa demanda comercial que o trecho possuiria, ainda torna questionável a operação de um trem da CPTM na vila, embora poderia ter a operação ao menos em alguns horários para atender a população que reside na vila.
TUE série 2100 partindo da estação Rio Grande da Serra. Trens da Linha 10 Turquesa fazem final na estação desde 2002. Foto: Victor Santos, 2018. |
Em 2019 a companhia anunciou o fim da necessidade de transferência entre os trens do Expresso Leste (Luz - Guaianases) e a extensão operacional da linha 11 Coral (Guaianases - Estudantes). A partir desse ponto, os passageiros poderiam seguir diretamente entre as duas extremidades da linha sem a necessidade de transbordo no meio do caminho, garantindo viagens mais ágeis e diretas para os passageiros do Alto do Tiete. Antes, os passageiros somente poderiam fazer as viagens diretas em horários menos frequentes que os demais.
Com isso, a antiga extensão operacional da Linha 11 Coral foi extinta, embora nos horários de pico ainda há trens indo somente até Guaianases para atender ao trecho de maior demanda. Durante os picos, os trens ficam intercalados entre Luz – Guaianases e Luz - Estudantes, enquanto nos demais horários e finais de semana apenas as viagens diretas até Estudantes são disponíveis. Isso foi permitido após a chegada dos 35 novos trens da série 8500 na linha, remanejando a série 2000 e 9000 para a linha 12 Safira, e retirando de operação até meados de 2018 os trens mais antigos das séries 1400, 1600, 4400 e 5500.
TUE série 4400 estacionado em Calmon Viana. Extensão operacional da Linha 11 Coral possuía trens antigos até meados de 2018. Foto: Victor Santos, 2018. |
Em setembro desse ano, a companhia agora disponibilizou as viagens diretas entre Brás e Jundiaí da linha 7 Rubi, que antes eram em poucos horários e agora é bem mais frequente e intercalando entre trens para Francisco Morato ou Jundiaí. Assim como na linha 11, a linha 7 recebeu todos os novos trens da série 9500, permitindo padronizar a linha com essa série e aumentando o número de trens disponíveis para a operação.
Uma curiosidade é que antes da pandemia do Convid-19, a linha 7 fazia terminal na estação do Brás apenas em dias úteis, nos demais dias fazendo final na estação Luz. Desde o início da pandemia, a linha está fixada na estação Brás, permitindo conexões com outras duas linhas da companhia.
TUE série 5400 no Pátio de Presidente Altino. Seis unidades foram reformadas para a nova extensão da Linha 8 Diamante em 2014. Foto: Gustavo Bonfate, 2016. |
Resta agora apenas a extensão operacional da Linha 8 Diamante, como já dissemos acima, foi reformada entre 2010 e 2014, trocando a bitola usada nos trilhos, reconstruindo estações e trocando a frota. Das cinco estações, apenas as estações Itapevi, Santa Rita e Amador Bueno foram reformadas, enquanto Ambuitá e Cimenrita foram desativadas e posteriormente demolidas.
O trecho é operado de forma diferente das demais linhas, onde o passageiro faz o pagamento da tarifa apenas na estação de Itapevi, uma vez que as paradas Amador Bueno e Santa Rita não possuem bilheterias para tal operação. Ou seja, o passageiro embarca sentido São Paulo faz o pagamento em Itapevi para seguir viagem, enquanto no sentido contrário o acesso é gratuito.
A série 5400 opera no trecho com quatro carros e uma baixa demanda se comparado as outras extensões operacionais que existiam até então. A série foi reformada após ser retirado de operação em 2011 do trecho principal da linha 8, sendo substituído por 36 trens da série 8000, mais modernos e eficientes que os antigos trens.
Apenas seis unidades foram reformadas, ganhando o novo padrão visual da CPTM e troca de alguns equipamentos, enquanto as demais unidades foram desativadas e depois sucateadas para abrir espaço nos pátios para os novos trens.
Benefício das viagens diretas
Com o fim dos transbordos no meio do caminho, a viagem dos passageiros pode ser feita de maneira mais eficaz e sem gerar atrasos ocasionados pela espera de outra composição ou intervalos não intercalados entre os trens do trecho principal e extensão operacional.
Além do benefício do tempo, as rotas mais diretas podem atrair um publico que antes não utilizava as linhas da CPTM por não achar conveniente a troca de trens ao longo do percurso, e agora pode utilizar as linhas e realizar menos conexões ao longo do percurso. Um exemplo é que sem a necessidade de trocar de trem em Guaianases, os passageiros da linha 11 Coral podem ter um acesso mais direto a capital paulista vindos do extremo Leste da Grande São Paulo.
O passageiro pode, por exemplo, seguir de Mogi das Cruzes até a região de Pinheiro, Zona Oeste de São Paulo, realizando apenas uma conexão na estação Luz (entre a Linha 11 Coral da CPTM e a Linha 4 Amarela da Via Quatro).
Rede metroferroviária de São Paulo e Região Metropolitana. Viagens diretas proporcionam menos baldeações. Mapa: Victor Santos, 2020. |
É perceptível que a CPTM também, por consequência, melhorou o atendimento dos passageiros dessas antigas extensões operacionais com a troca dos antigos trens por novos e com maior capacidade. Com a chegada desses novos trens entre 2016 e 2019, foi possível a desativação das séries mais antigas e o remanejamento da frota entre linhas, permitindo a diminuição de falhas e restrições que as frotas antigas traziam.
O que a CPTM precisará fazer agora?
Basicamente, garantir que as viagens continuem rápidas e os intervalos não sejam influenciados para não haver o descontentamento dos passageiros e problemas na operação, como falta de trens e restrições de velocidade.
A companhia precisa ainda resolver as questões de infraestrutura, como a sinalização para os trens, o fornecimento de energia elétrica para alimentar os trens, restrições de velocidade e estrutura das estações no geral.
Com o acréscimo de trens, fica evidente que a sinalização ainda não permite uma operação mais ágil em horários mais carregados do sistema, ocasionando na diminuição da velocidade comercial e restrição de mais trens em serviço.
Esse problema da sinalização e restrição de velocidade ainda assombra a companhia desde o seu início nos anos 1990, ocasionado pela falta de investimentos nas companhias férreas anteriores e posterior falta de investimento na própria CPTM nesse sentido.
TUE série 9500 estacionado na nova estação de Francisco Morato. Estação foi finalmente reconstruída e preparada para a demanda. Foto: Victor Santos, 2020. |
Outro fator muito importante que a companhia precisa solucionar é a informação direta aos passageiros sobre o destino de cada trem estacionado nas estações, que gera confusão entre os passageiros. Um exemplo disso é na estação Brás, onde os avisos sonoros sobre o destino dos trens ficam incompreensível devido aos ruídos internos (passagem dos trens, movimentação dos passageiros etc.) e externos (veículos nas ruas próximas, obras etc.).
Essa questão pode ser resolvida com a troca do auto falante das estações, painéis digitais para informar diretamente o usuário nas plataformas, além de avisos no interior dos próprios trens (este último já disponível).
Texto: Victor Santos.
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