quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

Transporte em São Paulo: ainda precisamos evoluir?

De quem é a prioridade? Foto: G1 (créditos ao autor).
Por anos a capital paulista foi uma grande referência para outras grandes cidades ao longo do Brasil, principalmente para sua região metropolitana, uma das maiores manchas urbanas do mundo. Seja através de novos ônibus com tecnologias avançadas, infraestrutura e monitoramento, São Paulo sempre esteve como portfólio de grandes empresas com foco nos transportes de passageiros. Mas será que São Paulo, maior capital do país, ainda é vista como referência no quesito mobilidade urbana?
Primeiro corredor de São Paulo foi projetado para a exclusividade dos trólebus. Foto: Autor.
Desde que o primeiro corredor exclusivo de ônibus foi implantado em 1980, São Paulo começava uma árdua e longa disputa para amenizar os problemas de mobilidade urbana que geravam muitos custos e prejuízos aos passageiros e operadores. A “disputa” entre o benefício aos passageiros e a cidade sempre foi na contramão dos custos e interesses políticos e empresariais que na maioria das vezes venciam. Mesmo assim a capital paulista conseguiu em quase 30 anos implantar diversos corredores de ônibus, terminais de transferência, sistemas de monitoramento e informação ao usuário, bilhetagem eletrônica e veículos mais modernos.
Atualmente o Brasil passa por um processo de inovação nos transportes, embora em ritmo lento, e vem implantando o conceito que Curitiba adotou na década de 1970 com corredores BRT – Bus Rapid Transit, ou Trânsito Rápido de Ônibus em português. Muitas cidades como Belém, Belo Horizonte, Curitiba, Goiânia e Rio de Janeiro implantaram o sistema de BRT para auxiliam o deslocamento de passageiros. 
A cidade de São Paulo tem atualmente apenas nove quilômetros de corredor no padrão BRT, e mesmo assim demorou e muito para implanta-lo. Pessoas ligadas ao transporte alegam que São Paulo não precisa de corredores BRT em suas avenidas pelo simples fato de possuir a maior rede metroferroviária do país, com 339,5 quilômetros de linhas de metrô e trem sendo 81,1 km do Metrô-SP e 258,4 km de linhas da CPTM. Mas o que dizer quando a própria rede metroferroviária é falha e atende pouco as necessidades?
Ônibus do BRT de Curitiba: sistema foi o primeiro no mundo em 1970. Foto: Gustavo Bonfate.
BRT Move-BH: Sistema auxilia os deslocamentos dentro e fora da cidade. Foto: Autor.

Por mais que a rede de metrô de São Paulo seja a maior do Brasil, as linhas foram projetadas de maneira para atender apenas as centralidades da cidade, sem considerar novos deslocamentos ou polos de concentração de serviços e comércios. A primeira linha foi inaugurada em setembro de 1974 e desde então vem expandido em marcha lenta a sua rede que só deve atingir a marca dos 100 km a longo prazo. Só para ser ter uma ideia, o Aeroporto de Congonhas, o segundo mais movimentado do país, até hoje não tem uma ligação direta com a rede férrea da cidade. O projeto que atenderia essa demanda vinda de voos nacionais deveria ser a Linha 17 Ouro do Metrô com tecnologia do monotrilho, mas esse projeto atrasou e o que deveria ficar pronto para a Copa FIFA de 2014, só deve ser concluída com trechos faltando em 2019 em diante, isso se nada acontecer. O mesmo ocorre com o Aeroporto Internacional de Cumbica em Guarulhos, que após 30 anos de sua abertura, finalmente terá um acesso a rede de trens de São Paulo através da Linha 13 Jade da CPTM, prevista para ser entregue em 2018.
Mesmo com novos trens, o metrô possui poucas linhas em operação. Foto: Yuri Gabriel.
A própria rede da CPTM, que herdou linhas antigas de ferrovias centenárias, não atende a todas as cidades da região metropolitana, que é a função da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos. Tanto o Metrô-SP quanto a CPTM são controladas pelo Governo Estadual de São Paulo e sofreram descaso por parte do poder público durante anos, atrasando obras essenciais de modernização e expansão do sistema. Agora fica a pergunta aos leitores: adianta ter a maior rede de metrô e trens metropolitanos se ela não atende a pontos de interesse importantes? Há do que se vangloriar perante as demais cidades brasileiras se todas as linhas de metrô e trem estão operando com trens lotados?
CPTM foi negligenciada por anos, mas vem recebendo melhorias aos poucos. Foto: Yuri Gabriel
Voltando para o sistema de ônibus, talvez a arrogância dos paulistas em olhar para outras cidades e tomar como partido novos conceitos, atrase cada vez mais o desenvolvimento dos transportes coletivos. Mesmo que a capital possua 118,2 km de corredores exclusivos, sem considerar as faixas de ônibus. Ainda que na região metropolitana possua dois corredores, ambos foram implantados visando apenas no atendimento imediato, sem gerar "gastos desnecessários". Na região do ABC existe o Corredor Metropolitano do ABD, atualmente operado e administrado pela Metra e "fiscalizado" pela EMTU-SP. Com 33 km de extensão, o corredor atende as cidades de Diadema, Mauá, Santo André, São Bernardo do Campo, além das regiões Leste (São Mateus) e Sul (Jabaquara) de São Paulo. Mesmo que os entusiastas alegam que o corredor está no padrão BRT, essa estrutura implantada é apenas um corredor exclusivo por não possuir alguns itens como pré embarque nas paradas. Outro corredor não devidamente implantado está localizado em Guarulhos, região norte da Grande São Paulo, onde a EMTU-SP (controlada pelo Governo Estadual) implantou em longas e demoradas fases o Corredor Metropolitano Guarulhos - São Paulo. Dos 20 km previstos, apenas 12 km entre os terminais Taboão - Cecap - Vila Galvão foram entregues e os passageiros aguardam pelo restante do projeto, que chegaria na Estação Tucuruvi da Linha 1 Azul do Metrô.
Corredor ABD: Simples mas importante, se assemelha mais a um corredor do que um BRT. Foto: Autor

Uma rede de transportes bem estruturada não depende de apenas um tipo de modal, mas de uma junção de vários modais como trens metropolitanos, metrô, VLT, BRT, trólebus, ônibus convencionais e ciclovias. Hoje, a capital paulista sofre pela dependência excessiva do metrô e do precário e antiquado sistema de ônibus e pela baixa capacidade da rede de transportes, tudo agravado pelo baixo investimentos da esfera pública. Durante os últimos 13 anos, a prefeitura gastou o dinheiro em corredores simples e de baixa capacidade ao invés de investir em corredores BRT como as demais capitais. Desperdiçou dinheiro público na retirada das redes de trólebus em favor do diesel, totalmente na contra mão de todos os argumentos técnicos das vantagens do transporte elétrico.
É óbvio que um corredor de ônibus no padrão BRT não substitui um metrô de alta capacidade, mesmo porque esse não é a função de um BRT, que na sua concepção deve ser um complemento e opção viável para regiões e necessidades distintas as quais o metrô serve. O custo e tempo gasto em um corredor BRT é significantemente menor que a construção de uma linha de metrô, embora o beneficio do metrô pesado seja maior.
A baixa eficiência do sistema sobre rodas já atrapalha a população durante mais de três décadas e vem sendo agravada pela falta de planejamento da gestora como cancelamento de linhas sem estudos, falta de fiscalização dela com as empresas contratadas e a falta de investimentos em infraestrutura. 
Corredor Pirituba-Centro: Corredores mais simples possuem baixa capacidade. Foto: Gustavo Bonfate.
Com a falta de estrutura, vêm também a falta de eficiência que a rede precisa ter, estando atualmente antiquada e pouco auxilia os passageiros em suas necessidades de deslocamento. São desde a falta de linhas em regiões importantes, até com o excesso de linhas com o mesmo itinerário ou a "concorrência" entre elas quando o certo era a conexão entre linhas locais e estruturais.
Mesmo que nos últimos 20 anos a frota e as linhas da cidade tenham evoluído, a cidade propriamente dita não acompanhou o desenvolvimento, afinal para que serve um ônibus moderno andando em vias precárias ou parando em pontos sem informações e conforto aos usuários? 
Estação Metrô Pedro II do Corredor Expresso Tiradentes: Único Corredor BRT da Cidade.
Se algum dia São Paulo foi uma cidade modelo para outras cidades, essa referência foi perdida há muito tempo, uma vez que cidades como Curitiba, Belo Horizonte e Rio de Janeiro adotaram uma solução ao transporte de média capacidade. Talvez seja o momento dos gestores e entusiastas dos transportes pararem de olhar somente o que São Paulo possui e começar a pensar no que a cidade precisa de fato, evoluir seu transporte e suas concepções. Embora não exista uma solução a curto prazo, adotar sistemas de média capacidade como Bondes e BRT já aliviaria os deslocamentos da população, principalmente em regiões onde o investimento de linhas de metrô seja inviável. Seja por trilhos ou pneus, a capital e sua região metropolitana necessita urgentemente de uma solução para os deslocamentos diários de milhões de cidadãos que aguardam ansiosamente por ela. 
Comparação entre uma parada do Corredor BRT de Belo Horizonte (acima), e o Corredor de São Paulo (abaixo).
Texto e revisão: Victor Santos e Gustavo Bonfate.
Fontes: Metrô-SP, CPTM, EMTU-SP, SPTrans e Move-BH.

Nenhum comentário:

Postar um comentário